quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Minha humilde opinião sobre o segundo turno na cidade de São Paulo

Fico feliz por não ter que votar em São Paulo. Se o PSDB tem a política repressora encarnada pelo Telhada, "defensor dos direitos humanos" nas palavras de Serra, o PT é mandante de um dos grandes  genocídios da nossa história lá em terras amazônicas. Entre um e outro, a nossa vontade é de escolher a morte, ainda mais quando nos deparamos com um Maluf-rota-na-rua no pacote do PT paulistano.
Talvez eu possa opinar com um pouco mais de propriedade sobre a educação, que é a minha área... tenho algumas considerações a fazer. A crítica direitista ao Haddad sempre bate num dos pontos mais positivos de sua gestão como ministro: o ENEM. É um vestibular bem menos excludente e permite que uma porção de gente pobre frequente a universidade pública. Isso eu vi de perto. O ProUni, por sua vez, é um crime que só favorece os barões da educação, e eu já manifestei minha opinião sobre isso tantas vezes que eu nem vou ficar me repetindo... Serra, enfim, como sempre, tem como mote de suas promessas para a educação a escola para formar peão. Ele só fala disso, podem conferir. Para Serra, pobre não pode sequer sonhar em frequentar o ensino superior e pensar além da caixinha.
E a educação básica? Não nutro grandes expectativas sobre nenhum dos dois. Enquanto ministro, Haddad não teve um mínimo de atenção para com a educação dos pequenos ou daqueles com os quais temos uma dívida histórica: os adultos que não aprenderam a ler e escrever na idade dita adequada. O Brasil está longe de erradicar o analfabetismo. Serra, então... Serra e educação numa mesma frase é erro de concordância. O tucano é mestre em culpabilizar o professor e a "família desestruturada" pelo fracasso da escola pública. Para Serra, solução para professor que reivindica melhores condições de trabalho é tropa de choque. 
O que eu posso lembrar é que o PT tem a experiência bem-sucedida dos CEUs. São poucos e as vagas são limitadas, mas não deixam de ser uma boa experiência. Marta fez questão de levar piscina, aula de dança e teatro para quem nunca teve isso. E tal atitude é digna de nota. Tenho certeza que Haddad, se eleito, dará continuidade a tal política (populista? talvez... mas garante um pouco de cidadania a quem vive com o pé no esgoto).
Sábado passado eu estive em uma favela marcada para queimar. Mais dia, menos dia, seus moradores serão despejados em virtude da Copa. Não espero intervenção positiva nem de um e nem de outro candidato, visto que as empreiteiras financiam a campanha de ambos, mas creio que o PT será mais amigável na hora de negociar um plano alternativo com os moradores. Não porque o PT seja bonzinho, mas porque é o seu jeito de fazer política: garantindo a imagem de partido amigo do povo.
Dona Cleonice, moradora de tal favela, espancada pelo marido, sem comer há dois dias, com seu filho de 14 anos fora da escola, me perguntou se ela ainda era cidadã. "Eu voto como qualquer outro, não voto? Eu vou votar no Haddad". Eu não sabia o que dizer para a Dona Cleonice. Meu desencanto só me permitiu sorrir e abraçá-la, enquanto pensava em como pode ser perversa a democracia representativa.

domingo, 14 de outubro de 2012

A revolução das formiguinhas

Essa é uma história parcialmente baseada em fatos reais que eu escrevi para crianças. Como vocês poderão perceber, eu e minha mãe também somos personagens. Estava num caderninho, esquecida, mas achei legal compartilhar. Foi escrita depois da Páscoa, eu acho, e transcrevi sem fazer grandes modificações. Achei mais honesto. Qualquer semelhança com Orwell não é mera coincidência. Por ser pensada para crianças, minha pequena fábula tem parágrafos curtos, coisa que eu não gosto muito de fazer, e, como de costume, escrevi de maneira bastante simples. Espero sugestões :-)

CAPÍTULO PRIMEIRO: ESTOCANDO MANTEIGA E RAIVA

Foi um verão de muito trabalho para as formiguinhas, sobretudo durante as festas humanas de fim de ano.
Na casa de Carolina, a ceia era bastante modesta, mas a Dona Maria tinha grande coração e deixou sobre o balcão, pensando justamente nas formiguinhas, duas grandes castanhas. Só aquelas castanhas já garantiam, pelo menos, dois meses de estoque para o inverno.
E trabalharam, trabalharam e trabalharam, as pobres formiguinhas, enquanto a rainha gorda ficava só dando ordens. 
Chegou a Páscoa* e a família de Carolina foi viajar. 
As formiguinhas, trabalhadoras que eram, aproveitaram a deixa para investir nos ovos de chocolate e bombons que a família deixou em casa.
Passaram-se dois dias. As formiguinhas já tinham conseguido levar para o formigueiro metade de um grande bombom com recheio de avelã.
Então, aconteceu.
Sem que tivessem tempo de fazer nada para se defender, as formiguinhas viram muitas de suas companheiras serem esmagadas e afogadas... A família havia retornado e Carolina, menina gulosa, foi direto para a caixa de bombons onde as formiguinhas estavam trabalhando. Quase que por reflexo, devido ao susto, Carolina jogou na pia o bombom cheio de formiguinhas e lavou as suas mãos, também cheia de formiguinhas. 
Seres humanos têm uma mania curiosa de pensar que só eles sentem dor. Decerto sentiram muita dor, as formiguinhas assassinadas naquele fim de tarde, mas a dor delas não saiu no jornal. Exceto na Gazeta Formigueiro, numa chamada de vinte segundos. 
A morte das formiguinhas no trabalho é tão rotineira que se tornou... banal. A Formiga Rainha não paga às famílias das formiguinhas mortas um seguro de vida.
Carolina e sua mãe, no entanto, atormentadas pela culpa, deixaram sobre o balcão da cozinha um grande bombom recheado de avelã; Carolina até cogitou escrever "me perdoem" num cartão, mas pensou bem e viu que era uma ideia bastante estúpida. 
As formiguinhas ignoraram solenemente o bombom. Até hoje não se sabe se por orgulho ou por medo. Ninguém, obviamente, contou à Formiga Rainha sobre essa recusa.
Chegou o inverno e o formigueiro estava fartamente abastecido.
Às formiguinhas trabalhadoras foi distribuído farelo de pão, enquanto a Rainha e os demais membros da nobreza comiam manteiga, castanhas e chocolate.
"Isso definitivamente não está certo", pensava Eleonor, uma formiguinha cujo pai e irmã haviam morrido enquanto traziam alimento para o formigueiro.

CAPÍTULO SEGUNDO: ORGANIZAÇÃO

As formiguinhas trabalhadoras foram convocadas para uma reunião.
Eleonor falava sobre justiça e suas palavras soavam como música nos ouvidos cansados das formiguinhas trabalhadoras. Cada uma delas tinha pelo menos uma história de perda e tristeza para contar. A jornada de trabalho era muito perigosa: era preciso atravessar uma pia onde qualquer passo em falso significaria a morte por afogamento; havia uma grande aranha com uma grande teia; havia o perigo de se prender no melado; havia, enfim, os humanos, tão estabanados e grandes.
As formiguinhas montaram um documento em que exigiam melhores condições de trabalho e entregaram à Rainha. A principal reivindicação era o fim da jornada diurna de trabalho (momento em que os humanos estavam acordados).
A Formiga Rainha leu o documento. Não acreditou e leu de novo. Como assim? Ela estava realmente muito brava com toda aquela subversão. Mandou prender a Eleonor. Disse que aconteceria o mesmo com quem mais a desobedecesse. Distribuiu um pouquinho de manteiga entre as formiguinhas trabalhadoras, para que elas não a detestassem tanto. 
Mas, bem lá no fundo, as formiguinhas sabiam que aquilo tudo estava muito, mas muito errado...

CAPÍTULO TERCEIRO: REVOLUÇÃO

Já estava próxima a Primavera e o estoque das formiguinhas trabalhadoras foi se acabando. Mas ainda estava muito frio para sair em busca de mais. 
As formiguinhas se dirigiram, então, aos aposentos da Rainha. 
Elas já estavam bastante aborrecidas com aquela situação toda, nem era só a falta de comida, elas também não se conformavam com a prisão da Eleonor. 
A Formiga Rainha disse que nada ia fazer, e que elas não mais a incomodassem com essas histórias. Chamou os guardas. 
As formiguinhas trabalhadoras não podiam acreditar... Trabalharam tanto durante a Primavera, Verão e até no Outono, e agora a Rainha lhes negava um punhado de pão?
Era inadmissível.
Era insustentável.
Juntas foram todas as formiguinhas até a delegacia para soltar a Eleonor. Elas falaram e não foram ouvidas. Falaram mais uma vez e mais uma vez não foram ouvidas. Então gritaram. Gritaram e quebraram aquilo tudo. A Gazeta Formigueiro ia dizer que foi depredação do patrimônio público, mas elas não estavam nem aí. Libertaram a Eleonor. 
Foram todas juntas até os aposentos da Rainha e cortaram-lhe a cabeça. 
Dividiram todo o chocolate, a manteiga e as castanhas que a rainha gorda escondia para comer sozinha. Só precisaram trabalhar no verão. Agora, pela primeira vez, para elas mesmas.

*Festa humana em que se celebra o renascimento de alguém muito influente com distribuição de chocolates.